domingo, 8 de maio de 2011

Aquiles e a verruga - Roberto Gomes

E pode? rsrs
Espero que riam com o inusitado dessa história.

Aquiles e a verruga - Roberto Gomes
Foi uma paixão fulminante. Um encontro casual numa sorveteria, uma noite num bar, um fim de semana no litoral. Estavam apaixonados. Duas semanas depois, resolveram morar juntos. Alugaram um apartamento minúsculo, onde mal cabiam os dois – e era isso mesmo que eles queriam. Juntos para sempre.
Passaram semanas esquecidos do mundo, entre o trabalho e o apartamento, onde viviam de refeições pedidas por telefone e DVDs assistidos até a madrugada. Era o amor, dizia ele. É o amor, ela respondia.
Até que numa madrugada, especialmente cálida e movimentada, ela ficou subitamente tensa, deu um salto da cama e exclamou:
– Você tem verruga!
– Tenho o quê?
– Verruga. Uma verruga horrorosa.
Ele tinha mesmo uma verruga no calcanhar esquerdo, já nem lembrava dela.
- É, tenho.
Ela acendeu a luz e saiu em busca do roupão, no qual se embrulhou, pudica.
– Por que não me disse antes?
– Por que eu deveria ter falado disso?
– Eu tenho horror a verrugas.
Ele tentou brincar:
– Você tem horror a verrugas. Eu tenho uma só.
– É o bastante. Você deveria ter falado disso.
– Da verruga?
– Da verruga. Estamos juntos há dois meses e você nunca me falou dela.
– Dela?
– Da verruga. É como se você mentisse para mim esse tempo todo.
– Mentisse? Mas você ficou doida, criatura? Eu tenho uma verruga, só isso.
– No tendão.
– Tudo bem, Outros têm verruga no dedo indicador. – tentou novamente fazer uma brincadeira – Se ainda fosse...
– Não faça piadinhas! É sério. Tenho fobia a verrugas.
– Não acredito. Você tem certeza de que não está brincando?
– Imagina! Não brinco com verrugas! É coisa séria.
Ela abriu o guarda-roupa, apanhou uma mala e começou a recolher suas roupas.
– O que você está fazendo? perguntou ele.
– Vou embora.
– Por causa de uma verruga?
– Isso mesmo. Não suporto verrugas. Tenho fobia.
Ele se levantou da cama e, inexplicavelmente, se sentiu chocado com a própria nudez. Colocou a calça do pijama. Aproximou-se dela. Ela gritou:
– Não me toque! Não ponha a mão em mim!
Ele abriu os braços, patético:
– Mas... E nossa paixão? Nossos sonhos? Nossos planos?
– Tudo acabado.
– Por causa de uma verruga?
– Por isso mesmo – disse ela, enfiando-se num jeans e numa camiseta.
– E se eu tirasse a verruga?
Colocando o tênis, ela dirigiu a ele um olhar cheio de pânico:
– Não adianta. Volta. Verruga é para sempre. Você corta aqui, ela renasce. Pula para outro lugar. Passa de um dedo para outro. Sinto muito.
Arrastou a mala até a porta, apanhou as chaves e disse:
– Amanhã eu volto para pegar o resto das minhas coisas. Adeus.
Antes de fechar a porta, ela apagou a luz e ele ficou ali, de pijama, no meio da sala, no escuro. Sozinho. Ele e a verruga. (Publicado em 10/05/2009)

Um ótimo dia das mães.
Abç
Tânia

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