Trago hoje no blog a reprodução do texto publicado no Informativo da UEM. Gostei muito da reflexão trazida pelo colega.
Informativo da UEM - ANO XX - nº 936 1º a 7/12/2010
Rotina docente e tempo para reflexão
Informativo da UEM - ANO XX - nº 936 1º a 7/12/2010
Rotina docente e tempo para reflexão
Washington Luiz Felix Santos * |
Nas últimas décadas, assistimos uma transição da universidade de organização institucional para organização instrumental, ou de instituição social para organização social. Uma transformação que nos limita a um conjunto de meios administrativos para alcançarmos objetivos específicos, pautada nas ideias de eficácia e sucesso e regida pelos conceitos de gestão, planejamento, previsão, controle e êxito. Desta forma a universidade, aos poucos, vai perdendo seu caráter de organização que incorpora valores importantes para a sociedade, que se molda conforme a pressão dos seus membros e do ambiente, levando em consideração preocupações que vão além de lucros ou resultados, como a sua sobrevivência, perenidade e universalidade. Tendo os sucessivos governos avançado nessas reformas, testemunhamos uma série de transformações da universidade brasileira, não sabendo ao certo para onde caminhamos.
“A cultura do PLUS, associada à falta de condições adequadas de trabalho para manter o nível de produtividade exigido está destruindo a saúde da coletividade docente”
A universidade pública perde espaço para o setor privado, que atualmente oferece 80% das vagas do ensino superior, favorecido por políticas que transferem recursos para o setor privado em detrimento dos investimentos no setor público. Por outro lado, na universidade pública avança a atuação das fundações de apoio ao ensino superior, organizações do tipo empresarial que provocam distorções no caráter público da universidade pública, seja pela oferta de cursos pagos, seja pela remuneração extra por meio de bolsas pagas à dirigentes de fundações ou participantes de projetos.
Outra característica da moderna universidade pública é a desvalorização do docente e a atual configuração do salário. Atualmente, diz-se que o salário dos docentes está constituído da seguinte forma: Salário básico baixo + PLUS, onde o importante é defender o PLUS, seja função gratificada, cargo comissionado, bolsa produtividade, bolsa em projeto de extensão, ensino à distância, participação em especialização lato-sensu, PDE, Parfor etc.
Neste ambiente, valoriza-se a competição e o individualismo em detrimento da solidariedade. Os professores lutam pelo PLUS para garantir uma remuneração minimamente satisfatória e ao mesmo tempo adoecem em exaustivas jornadas de trabalho sem as condições adequadas.
Mais um aspecto desta transformação da universidade pública são os mecanismos de avaliação do trabalho docente. Na UEM, a avaliação para a progressão na carreira – resolução nº 61/2003/CEP – é baseada em critérios produtivistas e prioriza as atividades vinculadas à pós-graduação stricto-sensu, seguindo a mesma lógica dos órgãos que financiam a pesquisa. Acreditamos que a resolução para a progressão na carreira deve estar vinculada às atribuições previstas para o cargo, de acordo com a legislação pertinente. Além disso, deve manter uma ponderação equilibrada entre atividades de ensino, pesquisa e extensão e respeitar as diversidades das áreas.
Enfim, muitas são as transformações da universidade pública no Brasil. No entanto, gostaríamos de chamar a atenção para uma delas. Como está o tempo do docente em relação a uma das atividades mais nobres da academia: a reflexão?
Na Constituição Federal, na LDB, no Estatuto da UEM, nas diretrizes de ensino de graduação ou em discursos de dirigentes do ensino superior é comum exaltar-se a importância da reflexão na formação dos nossos alunos e na prática da docência. Sabe-se que no ensino fundamental e médio, bem como nas universidades particulares, esse tempo tem sido extremamente prejudicado pela excessiva carga horária de aulas. E na UEM, como está atualmente a rotina dos docentes? Arrisco-me a dizer que a cultura do PLUS, associada à falta de condições adequadas de trabalho para manter o nível de produtividade exigido está destruindo a saúde da coletividade docente, roubando nosso tempo para reflexão e ao mesmo tempo, transformando a nossa instituição na universidade dos que muito produzem, mas que corre o risco de, no médio prazo, transformar-se também na universidade dos que não pensam, não transformam, não questionam a realidade, não se posicionam quando seus direitos são suprimidos e na qual os docentes não conseguem dar aos alunos uma formação para além da formação profissional, contribuindo efetivamente para a formação de cidadãos éticos, reflexivos e autônomos.
Professor do Departamento de Engenharia Têxtil
Graduação em Engenharia Química pela UEM
Doutorado em Química pela UEMPresidente do Sesduem (Seção Sindical dos Docentes da UEM)
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